Pessoas LGBTI+ aprisionadas em presídios de Santa Catarina estariam sofrendo violências por parte da instituição e por outros presos. Ameaças, humilhações, e a falta de acesso a trabalho e saúde estão entre as problemáticas denunciadas pelo MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), em um relatório divulgado na terça-feira (19). Em nota, o Governo do Estado não admitiu e nem negou as violências, e informou que trabalha para capacitar servidores.
O Mecanismo é um órgão vinculado ao MDHC (Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania). O “Relatório de inspeção nacional sobre a população LGBTI+ privada de liberdade no Brasil”, foi realizado com base na visita a 24 unidades prisionais de 12 estados, com o apoio da ONG Somos. Entre os locais estava a Penitenciária Masculina de Florianópolis e o Presídio Feminino Regional de Itajaí.
Em nota, a SAP (Secretaria de Administração Prisional e Educativa), afirmou que se esforça para alocar a população LGBTI+ no sistema prisional e trabalha na qualificação de policiais penais e servidores. Segundo a pasta, “qualquer denúncia o assunto é encaminhado para a Corregedoria para averiguação dos fatos”.
É uma ‘dupla segregação’ afirma perita do MNPCT
Na Penitenciária Masculina de Florianópolis, o MNPCT verificou que pessoas LGBTI+ são alocadas em alas chamadas de “seguro”, para protegê-las das ameaças por parte de outros aprisionados da unidade. No entanto, o local que preserva a integridade física isola a população e interrompe o acesso a políticas sociais e outras atividades, como o trabalho, apontou o relatório.
Também na penitenciária masculina, o tratamento pelo nome social ocorre “em partes”, assim como humilhações e falas preconceituosas no tratamento e atendimento das pessoas LGBTI+ aprisionadas.
Pessoas aprisionadas na penitenciária masculina em SC também relataram que sofrem violência física e psicológica de servidores de segurança e policiais penais. Conforme o MNPCT, o cenário é “extremamente violador”.
Para Bárbara Coloniese, perita do MNPCT, no local, o que ocorre é uma “dupla segregação”. “É necessário fazer mais processos formativos sobre a custódia da população LGBTI+ pois coletamos muitos relatos em relação ao desrespeito ao nome social, falas preconceituosas ao entregar preservativos, exclusão de acesso ao trabalho e educação o que gera uma dupla segregação no cárcere”, pontuou.
População LGBTI+ no presídio feminino encara ameaça constante
Já no Presídio Feminino Regional de Itajaí, não existe um local específico para abrigar pessoas LGBTI+. Segundo as aprisionadas, grupos ligados a organizações criminosas não aceitam pessoas da comunidade, e por isso “elas vivem sob ameaça e tensão no cárcere”, afirmou o documento.
No Presídio feminino, o respeito ao nome social “inexiste”, o que de acordo com o MNPCT, contraria “os diversos documentos supracitados que determinam o uso do nome social enquanto direito das pessoas trans privadas de liberdade”.
Porém, o presídio feminino é um dos dois únicos do Brasil onde não houve relatos de violência física e psicológica por parte dos servidores penais.
Falta acesso à saúde e ao trabalho às pessoas LGBTI+ aprisionadas
O relatório constatou que não há qualquer acesso ao trabalho interno e externo na Penitenciária Masculina de Florianópolis, assim como acesso aos estudos para pessoas LGBTI+ aprisionadas no local.
Pessoas da comunidade relatam que isso ocorre antes mesmo da pandemia, quando as atividades foram suspensas e que é motivado por três razões: “são minoria da unidade prisional, não são aceitos pela massa carcerária e há um nítido preconceito de incluí-los em tais atividades”.
O MNPCT aponta que, na visão da direção, a população LGBTI+ é um “problema” para a unidade e, por isso, pensar em qualquer forma de inserção em atividades seria extremamente difícil.
A penitenciária de Florianópolis é a única que fornece acesso à hormonização entre as unidades masculinas vistoriadas. No entanto, no que diz respeito a outras demandas de saúde, aprisionados LGBTI+ relatam que há demora para a realização de exames de HIV e HPV.
O preservativo é só entregue, em quantidade insuficiente, em um “kit feminino” destinado a mulheres trans e travestis. Na entrega dos resultados e de preservativos, por exemplo, as pessoas relatam ouvir piadas, perguntas e insinuações ofensivas e humilhantes por parte da equipe de saúde da penitenciária.
ReabilitaCÃO, em Itajaí, recebe destaque do MNPCT
O projeto “ReabilitaCão”, feito no Presídio Feminino Regional de Itajaí, recebeu um destaque no relatório do MNPCT. A iniciativa foi criada para atender os públicos mais vulneráveis no cárcere, dentre eles, a população transexual.
O objetivo é dar conhecimento técnico profissionalizante para quem está aprisionado e também cuidar da população canina abandonada da comunidade.