Imane Khelif é uma boxeadora argelina que está sendo alvo de ataques transfóbicos após sua disputa contra a italiana Angela Carini, nas oitavas de finais de boxe feminino das Olimpíadas de Paris, que aconteceu nessa quinta-feira (1º). Após o resultado da luta, que terminou após apenas 46 segundos, com a desistência da italiana, perfis conservadores começaram a atacar a atleta.
O Comitê Olímpico Internacional (COI) saiu em defesa da atleta, afirmando que toda atleta que disputa os jogos cumprem regulamentos. Além de argumentar que a desclassificação de Imane no Mundial de Boxe se deu de forma “arbitrária” e sem procedimentos adequados.
A lutadora cumpriu todos os requisitos para competir nas Olimpíadas, mas foi reprovada em um exame do campeonato mundial de 2023.
Khelif foi reprovada em exame no Mundial Feminino de Boxe 2023, por critérios confidenciais, e desclassificada pela Associação Internacional de Boxe (IBA).
Essa associação foi banida pelo COI após falhas de transparência, suposta manipulação de resultados e corrupção. O Comitê também afirmou que no site do IBA é possível ver que a decisão de desqualificação de Imane foi tomada apenas pelo secretário geral da associação e o CEO.
Além de Imane, a lutadora de boxe taiunesa Lin Yu-ting, que também está disputando as Olimpíadas de Paris, foi reprovada no exame do Campeonato Mundial de 2023.
Na última quarta-feira (31), a Associação veio a público informar que a argelina não foi submetida a um teste de testosterona, mas sim a outro exame, que acabou levando a atleta a ser desclassificada após não atingir os critérios determinados.
Apesar da confidencialidade do processo, o presidente do IBA, Umar Kremlev afirmou à Tass, a agência de notícias da Rússia, que nos testes do Campeonato Mundial Feminino de 2023 “houve atletas tentando se passar por mulheres”, pois estas tinham cromossomos XY, segundo testes de DNA. O que levou a muitos afirmarem que tanto que Imale era intersexo. A reportagem averiguou os documentos dos órgãos e matérias antigas sobre os exames do Campeonato Mundial Feminino de 2023 e Imane Khelif, mas não encontrou nenhum dado sobre a atleta ser ou não intersexual.”
Além dessa declaração, o IBA, na quinta-feira (1º), publicou em seu site a seguinte nota:
“A IBA nunca apoiará nenhuma luta de boxe entre os gêneros, pois a organização coloca a segurança e o bem-estar de nossos atletas em primeiro lugar. Estamos protegendo nossas mulheres e seus direitos de competir no ringue contra rivais iguais, e as defenderemos e apoiaremos em todas as instâncias; suas esperanças e sonhos nunca devem ser tirados por organizações que não estão dispostas a fazer a coisa certa em circunstâncias difíceis”.
Campanha de ódio contra Imane evidencia transfobia
Junto a isso isso veio um furor de perfis conservadores, que começaram campanhas de ódio contra a lutadora e demonstraram contrariedade a ideia dela lutar na categoria feminina, afirmando que ela é uma mulher trans – apesar de ser crime na Argélia ser transexual. Entre elas a escritora J.K. Rowling e o empresário Elon Musk, que anteriormente já haviam demonstrando posições transfóbicas em suas declarações.
Em seu perfil do X, a autora da saga Harry Potter, criticou o COI por permitir Imane lutar:
“Uma jovem boxeadora teve tudo pelo que trabalhou e treinou roubado porque vocês permitiram que um homem entrasse no ringue com ela. (…) Paris 24 será manchada para sempre pela injustiça brutal feita a Carini”.
A young female boxer has just had everything she’s worked and trained for snatched away because you allowed a male to get in the ring with her. You’re a disgrace, your ‘safeguarding’ is a joke and #Paris24 will be forever tarnished by the brutal injustice done to Carini. https://t.co/JMKzVljpyr
— J.K. Rowling (@jk_rowling) August 1, 2024
Em entrevista ao jornal italiano, Corriere della Sera, Angela Carini, que não havia cumprimentando Imane após sua desistência pediu desculpas e afirmou que “estava com muita raiva”.
A atleta italiana não cumprimentou a argelina após a desistência, mas saiu em defesa dela: “Não sou ninguém para julgar Imane. A verdade é que não sabemos nada sobre minha oponente, exceto por uma coisa: ela não tem culpa. Ela é uma mulher que está aqui para fazer as Olimpíadas, como eu”.
A declaração do Comitê Olímpico, pode ser lida completa nas redes sociais da organização:
Joint Paris 2024 Boxing Unit/IOC Statementhttps://t.co/22yVzxFuLd pic.twitter.com/fZvgsW8OOi
— IOC MEDIA (@iocmedia) August 1, 2024
Independente da polêmica envolvendo Imane Khelif, a atleta continua nos Jogos e vai enfrentar a húngara Anna Luca Hamori neste sábado (3), pelas quartas de final. Caso vença, a argelina já terá uma medalha garantida na competição.
Pessoas intersexo nas Olimpíadas
Apesar de não haver comprovação factual de que a atleta argelina seja intersexo, a polêmica abriu uma discussão sobre o tema.
Pessoas intersexo são aquelas com um conjunto de características biológicas que não se enquadram nas definições típicas do sexo masculino e feminino. Exemplo disso são pessoas que nascem com genitais femininos, mas possuem os cromossomos XY (que determinam o sexo masculino) e níveis de testosterona compatíveis aos de um corpo masculino.
Por muito tempo, essas pessoas foram chamadas pejorativamente de “hermafroditas”, mas o termo foi considerado biologicamente impreciso.
As definições de se atletas intersexuais podem ou não competir nas Olímpiadas seguem as normas das federações de cada modalidade. Como a IBA, que impedia atletas com cromossomos XY competir em eventos femininos, foi banida pelo COI, no caso de Imane ser intersexual, ela poderia continuar competindo mesmo assim.
* Sob supervisão de Danilo Duarte